9.9.14

Algum sonho

Ontem sonhei.

Aqueles sonhos claros e vívidos onde a mente tem plena certeza de que tudo não passa de um sonho e você não consegue deixar de lado a sensação de um bate papo com o subconsciente.

Era uma festa grande com muita gente, tanta gente que nos víamos, distantes em cada canto da enorme sala e não conseguíamos falar, mas nos víamos em toda a profundidade que tal ato pode existir.

E sorríamos, tínhamos descoberto alguma coisa nesse olhar longo e distante. Tínhamos descoberto um no outro aquela essência que a idade tenta esconder do mundo muito bruto, muito duro, muito pontiagudo. Tínhamos descoberto aquela pequena luz que brilha, que as pessoas chamam de criança interior.

Saímos de dentro um do outro e nos lançamos para algum lugar vazio, com cobertores felpudos de todos os lados, sem falar nenhuma palavra, ainda, mas nos vendo e nos comunicando pelo tato das tais cobertas felpudas, que dançavam e desenhavam perguntas ora levantando, ora baixando seus felpos.

Perguntamos um ao outro as coisas mais profundas, as dúvidas mais íntimas que a casca da vida já não deixa mais sair. Entendemo-nos e fomos embora.

Fomos embora e não voltamos mais para a festa já que as pessoas de lá não nos interessavam mais.

Nunca interessaram, apenas obstruíam o caminho para nos encontrarmos.

22.7.14

Dos pesadelos do dia

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O quarto está escuro mas uma claridade ofuscante invade meus olhos mesmo fechados. Pressiono-os violentamente para ver se o incômodo vai embora mas nada de melhor acontece. Estico as pernas, tento mentalizar a minha forma como ser humano mas meu corpo está perdido, minha cabeça perde-se dos limites do crânio, meus braços já não estão mais ao meu lado e os pulmões não respiram mais com a calma e frequência de outrem. Um descompasso emocional num limbo entre o o sono e o desperto.

Não tenho coragem de abrir os olhos para ver qual é a realidade pois tenho medo de realmente não estar mais composto como em outros tempos imaginei. Entro em um estado meditativo de medo e pesadelos que misturam qualquer som exterior com alguma imagem apavorante que faz o coração bater em um ritmo estranho.

Retiro a camiseta que cobria os olhos e descubro que já é dia. Quente lá fora, frio aqui dentro, frio que que insiste em não abandonar o recinto ignorando por completo qualquer atividade exterior. Abro portas e janelas, estico o peito para fora e deixo alguns raios de sol tomarem conta do meu corpo, luz que não incomoda, que conforta e que me faz lembrar das delícias da vida em grupo, que me faz esquecer dessa solidão que insisto em trazer para mim. Sento-me no chão e acaricio o vira lata aqui de casa lembrando das boas palavras da minha família, dos meus amigos, novos e antigos que, cada um a sua maneira, preocupam-se comigo e muitas vezes eu insisto em deixar de lado não por uma maldade pura minha, mas por um medo de não me colocar para o mundo como eu acho que deveria. Lembro das boas palavras e vejo minha projeção, fecho os olhos e me admiro caminhando e conversando e fazendo as pessoas rirem ou chorarem, me concentro nos pesos que já tirei de tantos ombros, nas lições que já deixei em tantas mentes e nos sorrisos que sei que algumas pessoas ainda tem nas faces por lembrarem-se de mim.

Agarro-me nessas memórias para sair de dentro de mim mesmo, desse possível buraco negro que eu mesmo criei para me esconder da luz com vergonha de mostrar para o mundo que sou falho, demasiadamente falho, demasiadamente humano, humano.
E com pavor pego novamente o papel e tremo por escrever as primeiras linhas já que nenhuma ficção é totalmente ausente de realidade e muitas vezes temos medo de encarar a nossa própria realidade de dentro do buraco negro, onde os elogios jamais chegam em sua plena forma, onde a autocrítica assume-se como monstro e faz das palavras das outras pessoas uma eterna mentira aos seus ouvidos.

Está ótimo transforma-se em treine mais.
Gostamos de você transforma-se em temos pena de você.
O auxílio por amor transforma-se em carregar um fardo.

Existe um pequeno ponto escuro capaz de cegar o mais genial dos homens. Nossa Caverna de Platão individual, nossa novela Pulp pessoal, nosso pequeno e privativo Crime e Castigo, um caminho que os criativos e sensíveis tendem a percorrer já que é muito fácil perder-se nas sinapses da mente, mas para tudo há uma saída, para sempre existe luz no final do túnel recheado de desafios que você deve cumprir “over and fucking over again” e desafiar-se a si próprio acatando as boas palavras que lhe querem fazer um agrado, os ombros gentis que querem lhe ajudar a atravessar, os pés que deixam-se ser massageados numa noite solitária com duas almas muito parecidas, muito perto do fogo, apreciando um silêncio confidencial de quem talvez não tenha o que falar por que não precisa falar.

E conforme as palavras vão correndo, seja saindo da boca para o ouvido muito próximo, sejam elas complicadas ou grunhidos e estalos de um sexo que não aconteceu ou de um beijo na testa, sejam elas escritas ou lidas, conforme as palavras vão correndo as sinapses voltam a trafegar para fora desse túnel escuro, fazendo você sempre lembrar que todo túnel escuro está dentro de uma bela e verde montanha e mesmo na mais completa escuridão ainda pode-se imaginar os pássaros cantando lá fora.

O corpo volta a tomar forma e a mente também. Os caminhos obscuros transformam-se em entidades que lhe acompanharão pelo resto da vida, sempre aguardando uma oportunidade para lhe colocar novamente onde você realmente não deseja estar.

Deixo as memórias saírem livres, as que eu havia agarrado com tanta força e lembro-me que posso sempre alçar um vôo solitário mas que jamais estarei sozinho.

 Click.

24.5.14

Poema 05 (acho)

Entrincamento da sinapses
que organizam os pensamentos
e deixam cada noite as linhas
mais curtas da cada vez mais longa
pagína de caderno sujo de vinho algum.

Foi tudo o que eu consegui escever
naquilo que nem um poema mudo é
e jamais será nada mais do que a falta de
talento escondido que quieto e só
tenta desaparecer de uma vez ou outra.

Alguém pergunta sem cuidado , finalmente,
onde você está que faz tempo não vem?
Largo no balcão o copo e o corpo para
ver de lado toda a curva que me faz ponte
onde antes só a neblina cobria coisa nenhuma.

Digo sem demora coisa nenhuma que já
tenha dito e sem vergonha sorrimos um
sorriso inesperado e acuado num canto de
tempos que não podíamos sorrir e penso no coração
que acabou de pular e mais uma mulher vai torcer. 

29.10.13

Crônica do amor eterno

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E lá estávamos nós.

Sentados na beira de um mundo que não existe, olhando para um horizonte que ninguém mais vê.

Pouco falávamos mas imaginávamos as mesmas coisas naquela simples e pura sintonia de quem já se conhece faz tempo.

Nos conhecíamos fazia tão pouco tempo. Não tivemos nenhum encontro, poucos abraços mais longos, nenhum momento de rubor. Nos encontrávamos já como melhores amigos de algumas gerações, Como se rodássemos mais rápido que o mundo entre encontros e desencontros. 

Talvez nosso primeiro contato tenha sido no Egito. Você rainha, eu plebeu a ser açoitado enquanto você observava do topo da Esfinge um mundo que ainda não lhe pertencia, apesar de todos dizerem o contrário. Um açoite mais forte do carrasco, uma lágrima que escorre do seu olho quando nossos olhares se encontram e lá estava a conexão formada por uma eternidade. A dor simultânea de dois humanos socialmente disparates. Talvez ali tenha começado o traçado que vai nos levar – será que nesse momento, será que nessa beira de mundo que não existe – para aquela frase tão mal utilizada nos dias de hoje.

Depois vem a Grécia antiga e continuamos nessa triste linha perpendicular do infininto que se cruza num único ponto/momento do universo, mas na infinidade que é um ponto jamais poderemos definir isso em anos ou dias ou meses ou até mesmo olhares. Continuamos, agora de batas brancas, você a recolher água de uma bica límpida com os seios quase à mostra e eu artista de rua em busca de uma inspiração para alguma piração que fizesse sentido aos meus estudos. Trocamos um olhar rápido e um sorriso e nunca mais nos vemos na imensidão que cerca o Pantheon. Talvez ali tenha começado um singelo sentido de alguma felicidade sem explicação e para aquele sempre sozinha.

E vamos passando pelas fases do mundo, trocando essa matéria quântica que exalamos na nossa morte e que depois transforma-se em vida novamente sempre buscando o que talvez não seja uma linha perpendicular mas sim uma espiral que há de unir-se no final das contas para tornar-se apenas uma coisa só. Rodamos o impressionismo onde pintei nua a modelo que arrancou de mim toda a vontade de qualquer outro amor, trocamos carta nas duas guerras que depois vieram, sentamos lado a lado no primeiro cinema, andamos juntos no primeiro avião, dançamos a valsa quando pensaram que a música já havia parado. 

Sobrevivemos ao Titanic, cada um correndo para um lado, para um continente distante e por aquilo que me passa na memória até tocamos nossas mãos enquanto o barco quebrava e você assumia seu lugar de vida salva.

Vivemos e viveremos dos encontros e desencontros mas finalmente, nessa beira de mundo que não existe, estamos mais próximos do que nunca estivemos. Seguro sua mão apoiada no joelho, olho nos seus olhos e dou um sorriso.

O mundo começa a fazer mais sentido agora. Não preciso lhe conhecer por que eu já lhe sei, por que de toda a eternidade até essa paisagem que nós imaginamos nós já viemos nos conhecendo. De forma devagar e espontânea, por entre lágrimas e olhares, por leves toques e esbarrões despreocupados nos trens lotados de Londres cada um em busca do seu próprio ser, por incertezas do Deja Vù constante de “eu sei quem você é, mas não te conheço”.

Sinto seu cheiro doce de mistura de frutas e penso que lhe amo.

Em voz alta você responde:

“Eu também.”

12.9.13

O homem que não sentia




No momento em que nasceu já via-se que ele não seria uma pessoa normal. Depois das 26 horas de parto onde a mãe quase morreu ele, nos braços do médico, não proferiu nenhum som. Com os olhos já arregalados, olhando o mundo a sua volta deu um primeiro suspiro e ao tapa do médico apenas respirou com mais força como se dissesse “Ei, para, já sei como faz.”
Ganhou o nome de Pedro, dado pelo fanatismo da avó que na verdade sonhava em ter um neto chamado Jesus mas a mãe, em todo o seu ateísmo negou veemente tal pedido deixando apenas Pedro nascer. Aquele que traiu, arrependeu-se e negou Cristo por três vezes.
Nunca chorou nem jamais sorriu por maior esforço que seus pais fizessem, melhor, por maior esforço que suas babás fizessem. Nunca teve pais presentes e os mesmos nunca sentiram-se na obrigação de amar aquela criança. Assim sendo teve de tudo, menos amor.
Amor que nunca sentiu falta por que, na realidade, nunca sentiu nada. Com os anos passando ganhou a consciência de que era diferente. Via seus amigos de escola rindo, brincando, enamorando, divertindo-se enquanto ele sentava-se no canto escuro e observava tudo sem interesse algum, sem sentimento algum, apenas absorvendo racionalmente todas as coisas e todas as verdades que lhe eram recebidas por seus cinco sentidos. Cinco sentidos numa mente ausente de sentimentos.
Vivia nos cantos escuros das melhores escolas com as melhores roupas, os melhores acessórios, os melhores cadernos e as melhores canetas. Aliás as duas únicas coisas que realmente se apegava. Seus cadernos e suas canetas. Enquanto sentava no seu canto escuro observando o mundo sentir escrevia tudo que via.
“Carlos bateu em Caio debaixo da árvore do pátio número dois. Caio correu chorando e gritando e Camila abraçou-lhe. Ele parou de chorar e foram de mãos dadas sorrindo até a lanchonete. Eles comeram algo que não consigo ver daqui. Por que choram e riem? Carlos está vindo para cá.”
Até aquele momento ninguém havia tentado relacionar-se com ele. De maneira nenhuma, sendo com carinho ou com raiva ou com chacota. Carlos estava sendo o primeiro. Chegou debochando de Pedro e batendo-lhe no caderno que foi ao chão. Gritava palavras como “estranho, bizarro, viado” e Pedro, nos seus 10 anos, pouco entendia o que ele queria. Mas sabia que desejava infringir-lhe dor. Tentava entender aquele momento e deixou que o primeiro soco lhe acertasse em cheio a têmpora. Sentiu a dor física enquanto ouvia Carlos rindo do seu corpo curvado. Levantou-se sem muita diferença em sua expressão e encarou seu oponente. Carlos veio para cima novamente. Em toda a sua ausência de sentimentos seus sentidos eram absurdamente aguçados. Desviou do segundo soco, agarrou o braço do outro menino, apoiou-o no banco e com um pisão dilacerou-o em três lugares diferentes. Carlos urrava, branco de medo enquanto todos da escola envolviam-se num êxtase completo de medo, horror, amor e amizade.
Pedro sentou-se e fez suas anotações.
“Carlos chora quando sente dor. Caio sorri quando sente amor.”

Depois daquele incidente a escola nunca mais foi a mesma. Ninguém nunca mais chegou perto de Pedro e até mesmo os professores tinham medo de lhe perguntar o que quer que fosse. Passou com excelência em todas as matérias menos redação pois seu professor Álvaro disse-lhe que apesar da excelente qualidade textual faltava sentimento naquilo que ele escrevia e/ou descrevia.
No final do terceiro ano letivo, aos 17, foi de ônibus para a sua formatura pois seus pais estavam em uma viagem de negócios e lá chegou, ouviu seu nome, pegou seu canudo e seu histórico escolar e encaminhou-se para a faculdade fazer a inscrição enquanto os outros alunos beijavam-se e abraçavam-se numa felicidade que ele talvez nunca fosse sentir.
Percebeu que para sobreviver nesse mundo precisava pelo menos fingir que sentia. Na faculdade de artes cênicas aprendeu a sorrir, chorar, rir e amar. Passava horas defronte ao espelho de sua casa buscando as expressões mais perfeitas que pudessem passar o sentimento mais pleno. Depois de dois anos de ensaios exaustivos viu que o mundo curvava-se a ele. Na faculdade era admirado pelo seu esforço e pelo seu amor à arte.
“Se soubessem que não tenho amor pela arte e interpreto esse amor eles achariam ainda melhor” Anotava em seu caderninho.
No seu décimo nono aniversário beijou sua primeira mulher. A lambança das línguas e a avidez daquela fêmea esfregando-se em seu corpo não era entendível. Ela jogou-o para dentro de um banheiro e ele executava alguns movimentos que havia aprendido assistindo filmes pornográficos ou Discovery Channel já que o coito é coito para qualquer mamífero. Ela desceu a mão em seu pau, ele virou-a com força, simulando raiva e tesão e ali perdeu sua virgindade sem prazer nenhum enquanto ela gemia e chorava.
Aos 21, depois de formar-se e já possuir uma certa carreira sólida em comerciais televisivos nasceu uma sensação rara dentro dele. Queria sentir. Começou a busca em coisas simples como filmes de comédia e Stand-ups, depois passou para shows de sexo e suspensão, tatuou as costas inteiras mas nada ativou nenhum  sentimento real dentro dele. Em tudo os olhos ficavam vidrados analisando friamente cada pedaço dos espetáculos assistidos e tentando associar os mesmos a conceitos que ele aprendera a simular na faculdade como humor, alegria, dor e prazer.
Nada. Não sentia nada.
Caminhava solitário e bem vestido pela noite da cidade buscando alguém que fosse igual a ele. Não tinha amigos de verdade mas muitas pessoas o tinham como eterno confidente então seu telefone insistia em tocar ou os bares que ele frequentava  insistiam em estar sempre com algum presente que lhe conhecesse e desejasse confessar-lhe todos os sentimentos do mundo.
“Eu mataria para ter aquela mulher novamente, Pedro. Mataria para voltar a sentir alguma coisa como senti com ela.”
E foi no final dessa noite, voltando para casa que um mendigo morreu com o pescoço quebrado pelas mãos de Pedro enquanto ele tentava sentir alguma coisa pela morte. A morte em si não havia lhe trazido nada de bom, mesmo depois de tentado diversas maneiras diferentes, diversos corpos diferentes. Mesmo depois de ter torturado todo tipo de ser humano, de mendigos a abastados, de freiras a putas, de padres a pedófilos de adultos a bebês. Desistiu da morte e da tortura seguida de morte depois de ter tentado as formas mais violentas, virulentas e repulsivas que um ser humano poderia imaginar. Mesmo depois de alimentar uma mãe com sua própria cria semi viva a ser fatiada defronte o pai que chorava e suplicava por clemência ele nada sentiu e resolveu abrir mão desse método falho. Limpou o porão que usava para tais práticas, moeu os restos mortais e alimentou seus quatro cachorros com essa família de retirantes que havia visto naquele “homem tão bondoso” a chance pro filho que viria a nascer. Tomou um banho, vestiu sua melhor roupa e foi para seu bar pensar em outra forma de sentir alguma coisa.
Pediu gin e tônica pela maneira como o amargo mexia com suas papilas gustativas e a como o gin turvava levemente sua visão e lhe causava uma lentidão racional. Enquanto respondia mecanicamente as perguntas do seu pseudo amigo bartender uma morena adentrou-se pelo bar. Ele sabia que ela era uma nota 10 para os padrões de beleza dos dias atuais mesmo ele não podendo achá-la bela já que a beleza na verdade não é vista, mas sim sentida. Seu sucesso com as mulheres era claro. Um ótimo ator sabe como impressionar qualquer ser humano, principalmente uma mulher que busca eterna e avidamente por alguma coisa que valha a pena chamar de amor. Ela pede um drink, ele oferece um cigarro, ela pede uma saideira, ele oferece um amasso, ela pede mais um sorriso e já no hall de entrada da sua casa ela sente-se completa e loucamente apaixonada por ele. O homem perfeito de todas as maneiras, do bom gosto aos trejeitos “naturais” nos momentos exatos, o carinho bem dirigido, a pegada forte quando ela queria fraca, essa selvageria arrogante e prepotente a deixa de joelhos e de joelhos ela lhe sorve o pau que minutos depois lhe fornece os mais longos orgasmos já sentidos. Líquidos escorrem das suas pernas, dos seus olhos. Ele olha para aquele corpo descontrolado completamente controlado por ele babando como uma débil mental que não comanda mais a própria vida e sente um asco tremendo.
Para e pensa.
Sentiu um asco tremendo.
Ela olha assustada para ele.
“Sai daqui. Você não vale nada.”
“Mas, mas, mas... eu te amo. Vo-vo-você é a melhor coisa que já me aconteceu”
Ele acende um cigarro e prepara mais um drink enquanto pega as roupas dela e junta com cuidado na cama.
“O que você sente, mulher?”
“Como se você tivesse me levado para o melhor lugar do mundo e depois me matado por dentro. Sei que depois de você nunca mais vou sentir mais nada”
“Exato. Agora se veste e sai.”
Ela já sai sem um sorriso no rosto, sem expressão de dor nenhuma, sem mais nada por dentro.
Ele vai até a varanda e um leve sorriso desponta em sua boca.
Ele sente alegria.
Dias depois ele volta àquele mesmo bar e lá está ela. Sentada tomando um gin e tônica com os olhos apagados a conquistar algum homem. Algum homem que estará lá na semana seguinte com os olhos apagados pronto para apagar a alma de mais alguém.
E assim Pedro descobriu como sentir e a cada semana sentia com uma mulher diferente, sentia o asco do ápice da entrega e da demência feminina e a alegria quando via a morte em vida daquele ser.
Pedro secava as almas para inundar seu corpo ausente de espírito.

14.8.13

entre mim e ti.

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Não é uma obrigação.
Não que não devesse ser, mas escrever não é uma obrigação. Talvez se fosse eu já estaria com algumas dezenas de milhares na minha conta mas como eu vejo a escrita como um hobby – tipo sexo – faço o possível para não ganhar dinheiro com isso. Entenda da seguinte maneira:
 Se você fosse um ator pornô, ainda teria o mesmo paazer em seduzir uma mulher para levá-la para a cama ou não aguentaria mais por que já viu demais “daquilo” no seu trabalho?
Se você trabalhasse no Mc donalds ainda comeria lá? Entende?
            Talvez se fosse uma obrigação eu já teria escrito o maior best seller dessa geração mas estaria a pagar noites e noites de psicanálise com alguma mulher muito sensual que eu faria questão de transar simplesmente por que não aguentaria chegar em casa e escrever uma linha honesta que fosse. Danem-se as vírgulas e o bom português. Se eu fizesse o que eu amo talvez fosse infeliz!
Essa é uma puta de uma discussão ego-filosófica.
            Não escrevo por ser uma obrigação mas por ser uma necessidade. Mesmo tendo uma mesa defronte a uma janela e pouco abrigo para as mãos, escrevo agora com os dedos congelando, a janela aberta e muito vento a castigar um peito coberto por malhas e mais malhas de lã. E ainda algumas mulheres pensam que escritores são figuras sensuais a escrever com copos de conhaque ao lado e um jaleco cheio de estilo durante o inverno, olhando para a janela e “sentindo” esse vento que o castiga como as mulheres sem coração da sua vida já o fizeram. Ou então no calor extremo do verão bebericam seus Mojitos com as regatas brancas e suas cuecas boxers sempre tão limpas a pensar que o sol lhe faz feliz assim como aquela mulher já o fez antes do inverno chegar e o calor do abraço transformar-se no simples e puro açoite do vento gélido.
            Não.
A vida de um escritor está longe dessa visão bucólica de poetas a morrer de tuberculose na beira de rios nos velhos e bons tempos dos poemas brasileiros. A vida de um escritor está mais para o simples e puro desespero dos loucos do asilo ou na pura idiotice e ignorância dos velhos do retiro. Estamos a sofrer da forma mais mundana possível, a sentir o frio apenas como frio e o sol apenas como sol e as mulheres, essas não, essas sentimos como elas devem ser sentidas em todo o seu máximo de dor e sofrimento e dicotomia entre a alegria plena quase milagorsa e a tristeza plena onde as pernas queimam já inseridas no fogo do inferno.
            Não vejo um futuro e nunca vislumbrei minha vida após a primeira noite sofrendo por uma mulher. Descobri ali a minha verdade a a minha sina. Sempre sofrer e usar desse sofrimento como verdade eterna. Bebo na alegria como assim caminho na felicidade. Admiro o mundo, as pessoas, os dias e as noites mas apenas o faço para poder seduzir a próxima mulher a qual eu farei 100% feliz e ela me fara 100% miserável. Meu alimento mundano é a satisfação do ser superior a mim. Assim como um vassalo entrego meus serviços a qualquer vampira que deseje sugar de mim todos os prazeres que eu possa oferecer assim como o amor que terei eternamente por ela e saia mais forte, mais mulher, mais inteira enquanto eu debato-me mais uma vez por copos e amizades e novas mulher na busca mais uma vez daquela que esteja pronta para entregar-se ao êcstase que posso oferecer pela simples troca de um sofrimento real e profundo que dê sentido à felicidade e liberdade que é a minha vida.
            Sofro por que é de lá que me vem a alegria de buscar um novo sofrimento.
            Sofro por saber que essa doação que faço de mim mesmo eleva aquele ser já superior mas perdido em tudo que lhe consome como sociedade, cultura e próprios sentimentos a lhe tapar a visão de como é simples a vida para aqueles corpos rodados, redondos e salientes.
            Não se bebe sem um amor.
Uma garrafa nunca seca assim como a perna nunca queima se você não possuir um amor a ser esquecido. É o esquecimento daquilo que te consome que te leva adiante, para frente e avante (Rá!) o mais rápido possível para que você deixe toda a dor e toda aquela babaquice que um dia você chamou de amor no buraco escuro do esquecimento. E nessa caminhada, nessa busca pelo lugar mais distante daquilo que um dia você já esteve, BAM! Você encontra novamente aquilo que vai lhe derrubar mais uma vez. O eterno confronto do homem que busca sempre fazer de todas as mulheres da sua vida a única.
            E depois de um tempo, depois de passar anos autodestruindo-se por tudo o que você já viveu, você abre os olhos como um zumbi e caminha pelo mundo sem nunca mais pensar em fazer uma mulher feliz. Esquece a felicidade e o sofrimento e no piloto automático da vida caminha brincando e jogando com sentimentos alheios sem mais possuir um próprio e, vejam lá, chama isso de crescimento, de amadurecimento.
Bullshit.
Vamos chamar isso de medo e vamos deixar esse medo de lado e bater na porta daquela moça que vive naquele apartamento tão bagunçado quanto o seu “eu” e vamos nos machucar novamente. Não quero a eternidade e talvez já pense em começar o que eu tenho certeza que tem um fim esperando que você seja aquela mulher verdadeira que quando eu surtar nas minhas bebedeiras e besteiras a esperar que você me deixe, pegue minha mão, me coloque no colo e diga
-       “Shhhh, eu te amo também. De verdade.”
Eu e você, moça do apartamento bagunçado, somos como esse conto que eu acho que deveria terminar por aqui mas não acaba por que eu não consigo ver um final assim tão simples e tão óbvio.
E ai depois de muito tempo num silêncio extremamente  inapropriado eu coloco aquele som que a gente nunca ouviu por que sempre estamos a discutir nosso passado e nossa relação e em como eu já te machuquei e como você nunca percebeu as sutilezas do meu amor mesmo nas atitutdes menos cabíveis de amor como palavras duras e silêncios inexpressivos. Eu que sempre esperei que você fosse aquela mulher que em toda essa minha revolta pessoal e silênciosa pegasse em minhã mão e dissesse baixinho no meu ouvido:
-       “Shhhh, eu te amo também. De verdade.”
Mas não, você nunca disse e eu também nunca lhe joguei na parede com força suficiente para fazer você esquecer esse homem do amor eterno e escondido que sou e lembrar simplesmente que sou homem e lhe amo ao ponto de ser violento, mulher desse apartamento bagunçado que um dia ainda hei de arrumar como irei arrumar-nos.
Existem tantos erros nessas palavras como existem atitudes erradas entre nós. Agora que jogo o jogo da verdade e você coloca de lado a sinceridade, eu fico aqui ouvindo músicas que quase me levam a rimas embraçosas. “Jogo o jogo da verdade e você coloca de lado a sinceridade”. Me diga o quanto piegas é isso, o quanto Clarisse Falcão ou “a melhor banda da cidade” é isso!? Sinto-me perfeitamente encaixado no extremo absurdo do que é estar ao seu lado e um dia, num almoço de família, que já conheço a mais tempo do que a sua vida, levante, bata no copo com o talher sujo de qualquer comida e diga para todas as famílias
-       Essa é a minha namorada.
E você em toda a sua incorência e vergonha que lhe cabe tão bem nesse corpo alto e esbelto com esses seios que você insistiu em melhorar me puxe pelo braço após os sons de espanto e aprovações e diga baixinho no meu ouvido só pra me fazer parar de tremer
-       “Shhhh, eu te amo também. De verdade.”
E ai na segunda música eu lembro quem eu sou e guardo esse “eu” que fala tanto de alguém pra procurar qualquer vagabunda que me silencie e faça eu esquecer que não exite amor em São Paulo nem em lugar algum.
Talvez só entre eu e você.

           

3.8.13

De A a Z

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Antes aludia e adiava a amante. Adiava a água e advinha o álamo que alcançava a aceitação através da amada agora apegada apenas ao assunto advérbio, adjetivo e adendo. Antes abastecia a alma com amor, agora adianto a arma e atiro a
bala beijada pela boca besuntata de besteiras. Brinco com a besta banalizada e batizo-a batendo o bastão bastando a bela bunda a brincar de bumbum. Baixo ao bar bêbado e
canto uma canção corajosa. Calmo caminho com cuidado e calo ao concentrar o corpo no calor do cabelo a cobrir o colo. Carinhosamente cuido da cama que cabe o coma e
deito o desejo dentre os dentes do distúrbio. Deixa dormir a demência, o doente, a dor de dente. Demora no devir, descobre o dorso e a delícia do desmentir a destruição da dádiva. Deixa a dor doer e dorme
enquanto o estranho encontra as entranhas da escolhida e envolve estilo encharpe. Escolhe, evolui, existe e enamora o encontro. Essa existência exige eméritos e ermos, estudiosos e estudantes, eruditos e excluídos. Exclui o entre e esteja entre as
falas da família que falta força. O fluído da fêmea que fortalece a fronteira da forma.  Flui na floresta a fuçar as flores e fornicar com as fadas. Fere a falsidade da felicidade e fita o fenômeno feliz fechando a fechadura e folga a
gola para o gole. Gosta do gosto? Gosta do gesto e gesticula com as genitálias da grandiosa gata que geme gostoso. Goza o gozo gélido da grotesca gigante! O gelo na goela é
hoje o que há do que houve. Histeria humana e histórica humildade do homem da horta e das hortaliças. Habito o que herdei com harmonia e com horror. Hábil como um hipopótamo, herege como um homicida
incunbido das incongruências que incomodam o inconsequente intuito de inventar a idiotice. Idiota que idolatra as idiossincrasias da igualdade infundada. Impressiona-se com a iluminação mas o inferno infesta-se de infâmes infelizes. A Imaginação ilustra a ingenuidade do imigrante imerso no impacto do império. Impostos impostos no íntimo do que é indizível e inflamado o indivíduo impõe o instinto e implode em imensas, inúmeras, impossíveis e até íntimas insanidades que
jamais jorrarão o jato do julgamento. Juntos sem justiça, juz ao juramento jogam de Judas e judiam os joelhos no jóio. Jocosas jardineiras jogam jóias aos jacarés e com jeito juram aos jumentos.
Levante-se e leve o líquido à luz, Leviatã das leis laicas e lamba as larvas com labaredas lascivas! Lascivo lábio lotado de ladainhas e de leituras lavadas e levadas. Ladrão que lança a lança nos líderes e é linchado pelas libélulas. Lutamos as lutas longínquas e largamos o laço ao léu. Leviana liberdade de lixeira lavrada de loucas loucuras a lotar os loucos leprosos.
Mas a maravilha mantêm sua manha e mostra o momento. Morde a mulher e mascara a morte que movimenta-se meticulosamente, menina manhosa manifesta-se manchando e melindrando sua marca pelo mundo. Mundanos e macabros machucam a mente, mexendo, manejando, munindo-se de munição maldosa. Maldade que maltrata a matilha da mulher Madalena. Madrugam os menestréis e mostram que a mágoa molha os malandros mas os molda na musicada maneira de mentir.
Não necessariamente na noite navegam os negligenciados nutridos de nada. Nunca notam a nuca  nua das namoradas e as nuances das nádegas. Nasce na natureza sem a necessidade de nela necrosar. Néctar da novidade nefasta de ninguém! Não nomeamos nenhum navio que nos norteia e natimortos notamos a
obscuridade e a obsolência do objeto e do objetivo. Oramos ontem e olhamos onde obedecíamos a ordem. Aos otários e oriundos ocorre que ocupam o oculto com seus ovos de ouro. Odeiam sem observar o ódio e obedecem sem observar o olho. As olheiras ofendem-se com os omissos da oposição e oxigenam
parte das pacientes pessoas peladas de provérbios e pudores. Putas passeiam pelas pautas dos poemas podres e possessivos  a prender prendas perfeitamente puras. A pureza da pele pede por prazer mas prefere pedir por pudor. Paga-se o preço do pecado com pés pungidos e pinga do padrasto. Perdidos, pacíficos e passíveis de problemas que palavras podem perder.
Queremos a quimera queimando as queixas, as questões e as queimaduras de uma quebrada qualidade. Queremos quartos quentes e queremos questionar o quanto quisermos quando nos
resta restringir o remédio para os resilientes. O resto recosta-se ao relento e roe-se racionalmente no rancoroso e real rasgo de rasuras. Ratos roem a roupa do rei de roma e recorrem à ralé recebendo recados e receios e requintes.
Sinto saudades do silêncio
Tenho a tentação de terminar o
Universo de unicidades e
Verdades veladas

nos
“Xiszes” da
Zombaria.