29.10.13

Crônica do amor eterno

-->


E lá estávamos nós.

Sentados na beira de um mundo que não existe, olhando para um horizonte que ninguém mais vê.

Pouco falávamos mas imaginávamos as mesmas coisas naquela simples e pura sintonia de quem já se conhece faz tempo.

Nos conhecíamos fazia tão pouco tempo. Não tivemos nenhum encontro, poucos abraços mais longos, nenhum momento de rubor. Nos encontrávamos já como melhores amigos de algumas gerações, Como se rodássemos mais rápido que o mundo entre encontros e desencontros. 

Talvez nosso primeiro contato tenha sido no Egito. Você rainha, eu plebeu a ser açoitado enquanto você observava do topo da Esfinge um mundo que ainda não lhe pertencia, apesar de todos dizerem o contrário. Um açoite mais forte do carrasco, uma lágrima que escorre do seu olho quando nossos olhares se encontram e lá estava a conexão formada por uma eternidade. A dor simultânea de dois humanos socialmente disparates. Talvez ali tenha começado o traçado que vai nos levar – será que nesse momento, será que nessa beira de mundo que não existe – para aquela frase tão mal utilizada nos dias de hoje.

Depois vem a Grécia antiga e continuamos nessa triste linha perpendicular do infininto que se cruza num único ponto/momento do universo, mas na infinidade que é um ponto jamais poderemos definir isso em anos ou dias ou meses ou até mesmo olhares. Continuamos, agora de batas brancas, você a recolher água de uma bica límpida com os seios quase à mostra e eu artista de rua em busca de uma inspiração para alguma piração que fizesse sentido aos meus estudos. Trocamos um olhar rápido e um sorriso e nunca mais nos vemos na imensidão que cerca o Pantheon. Talvez ali tenha começado um singelo sentido de alguma felicidade sem explicação e para aquele sempre sozinha.

E vamos passando pelas fases do mundo, trocando essa matéria quântica que exalamos na nossa morte e que depois transforma-se em vida novamente sempre buscando o que talvez não seja uma linha perpendicular mas sim uma espiral que há de unir-se no final das contas para tornar-se apenas uma coisa só. Rodamos o impressionismo onde pintei nua a modelo que arrancou de mim toda a vontade de qualquer outro amor, trocamos carta nas duas guerras que depois vieram, sentamos lado a lado no primeiro cinema, andamos juntos no primeiro avião, dançamos a valsa quando pensaram que a música já havia parado. 

Sobrevivemos ao Titanic, cada um correndo para um lado, para um continente distante e por aquilo que me passa na memória até tocamos nossas mãos enquanto o barco quebrava e você assumia seu lugar de vida salva.

Vivemos e viveremos dos encontros e desencontros mas finalmente, nessa beira de mundo que não existe, estamos mais próximos do que nunca estivemos. Seguro sua mão apoiada no joelho, olho nos seus olhos e dou um sorriso.

O mundo começa a fazer mais sentido agora. Não preciso lhe conhecer por que eu já lhe sei, por que de toda a eternidade até essa paisagem que nós imaginamos nós já viemos nos conhecendo. De forma devagar e espontânea, por entre lágrimas e olhares, por leves toques e esbarrões despreocupados nos trens lotados de Londres cada um em busca do seu próprio ser, por incertezas do Deja Vù constante de “eu sei quem você é, mas não te conheço”.

Sinto seu cheiro doce de mistura de frutas e penso que lhe amo.

Em voz alta você responde:

“Eu também.”

Um comentário:

Anônimo disse...

eu fiz um blog. http://amargalice.blogspot.com.br/